segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Consumidores barrados na "ficha suja" do Banco Central

A administradora de empresas Geany Soraia Porto e o marido Francisco Luzimar questionaram na Justiça a compra de um carro financiado. Meses depois tentaram o financiamento de um imóvel e foram informados que o crédito não poderia ser concedido porque havia restrição mesmo sem o nome deles estar inscrito no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) ou Serasa. O advogado da família descobriu que o nome de Luzimar estava na chamada lista do Sistema de Informações de Crédito do Banco Central (SCR), um banco de dados que registra empréstimos, financiamentos, garantias de pessoas físicas e jurídicas perante instituições financeiras.

O SCR é alimentado mensalmente pelas instituições financeiras, mediante coleta de informações sobre as operações no valor igual ou superior a R$ 5 mil, a vencer e vencidas. Também estão lá os valores referentes às fianças e aos avais prestados pelas instituições financeiras a seus clientes.

Letras miúdas

Segundo o Banco Central (BC), além da própria instituição, podem ter acesso às informações todas as instituições que fazem parte do Sistema Financeiro Nacional, desde que tenham autorização específica dos clientes, e os próprios clientes. Só que ninguém sabe, ou apenas poucas pessoas têm conhecimento da existência dessa autorização impressa em contratos de financiamento, por adesão, escrito em letras pequenas, que a maioria da população se submete.

Segundo o presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE), Eginardo Rolim, todo mundo autoriza sem saber e quem entra com ação revisional de dívida fica com o crédito restrito. O presidente do Conselho Federal da OAB, Hércules Amaral, que vai debater o tema na Comissão Nacional de Defesa do Consumidor no próximo dia 15 de agosto, aponta uma série de ilegalidades nessa prática.

Destaca a quebra de sigilo de dados, porque a informação acessada por todas as instituições é patrocinada pelo BC. "Em outras palavras, pelo Poder Público", completa, lembrando que o artigo 39, inciso 7º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), veda "repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos".

A administradora Geany Porto lamenta o uso da lista do BC pelas instituições financeiras, mas diz que o consumidor não deve desistir de lutar pelos seus direitos.

Para Hércules Amaral, o consumidor criterioso, que questiona juros extorsivos, cláusulas abusivas, e tem o direito de fazer isso, é punido. "O consumidor consciente é discriminado e embora não esteja com o nome negativado é considerado indesejável", completa. Observa que o artigo 43 do CDC também é descumprido. De acordo com o artigo, a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor. O descumprimento do artigo pode gerar a multa de até R$ 30 milhões.

Outra prática ilegal é a não informação da negação do crédito. Isso porque o artigo 6º do CDC afirma que é direito básico do consumidor "a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços".

Legislação

Art. 43 - O consumidor (...) terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.

§ 1º - Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos.

§ 2º - A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele".

"Art. 6º - São direitos básicos do consumidor: (...)a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem"

"Art. 39 - É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços: (...) repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos"

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