Muitos consumidores, animados com a praticidade dos cartões de crédito não sabem que estão pagando as taxas de juros mais altas do mundo. Ao parcelar uma fatura em atraso paga juro de 12% ao mês, o que, no acumulado no ano, chega a 550%. Para se ter ideia da distorção, os juros básicos da economia brasileira estão em 10,75% ao ano e algumas linhas do BNDES para empresas, que são subsidiadas por todos os brasileiros, custam apenas 4,5% ao ano. É contra esse custo estratosférico de juros aos consumidores nos cartões e outros custos altos que envolvem essa indústria de dinheiro de plástico que a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), presidida pelo catarinense Roque Pellizzaro Junior, vem desenvolvendo uma longa cruzada. Uma das vitórias foi a mudança nas maquininhas.
Qual é a vantagem de uma única máquina para cartões nas lojas?
Roque Pellizzaro Junior - Tínhamos um contrato entre a Visa e a antiga Visanet, hoje Cielo, que obrigava que os cartões Visa só poderiam ser recebidos pela credenciadora Visanet. E a Visanet não poderia receber nenhum outro cartão que não fosse o Visa. Isso fazia com que existissem dois monopólios no Brasil, o Visanet Visa e o Redecard Mastercard. Lembrando que Visa e Mastercard são bandeiras que representam 97% do mercado de cartões de crédito no país. Com isso, o foco todo da indústria de cartões era nos emissores, os bancos. Quanto mais cartões de uma bandeira eram emtidos, mais clientes tinha, e isso fazia com que os comerciantes pagassem mais de taxa para as credenciadoras Visanet e Redecard. Com a mudança, as máquinas da Cielo (ex-Visanet) e da Redecard podem receber todos os cartões e a gente cria uma concorrência entre as duas. O foco deixa de ser o emissor bancos, e passa a ser o lojista.
As credenciadoras vão ganhar menos com essa mudança?
Pellizzaro - Elas devem perder, de mercado, em torno de 45% nos próximos 12 meses. Nenhum lojista vai ficar com duas máquinas. Ninguém vai gastar duas vezes para ter a mesma coisa. Com isso, elas vão perder mercado e faturamento no aluguel de equipamento. Só na Redecard, o aluguel representava 23% do faturamento. Para as duas, a receita somava R$ 1,5 bilhão de aluguel de maquininhas. Este valor vai baixar para cerca de R$ 1 bilhão a menos em locação, fora uma perda na taxa de desconto de 20% a 30%. Uma empresa que pagava 5% vai pagar 4,2% ou 4% de taxa de desconto. Isso vai adequar melhor o mercado.
A CNDL está incentivando o aumento da concorrência?
Pellizzaro - Já temos a Getnet junto com o Santander, e a First Data, que é a maior credenciadora do mundo, sinaliza que vem para o Brasil. Está procurando parceiros, entre os quais nós, as CDLs. A bandeira Elo está sendo ressuscitada pelo Bradesco e Banco do Brasil.
O que o consumidor paga?
Pellizzaro - O consumidor paga tudo nos cartões. Paga o valor que está embutido na mercadoria, que é a taxa de desconto, e a taxa de antecipação. Quem recolhe a taxa é o lojista, mas quem paga é o consumidor. Além disso, existem os custos vinculados ao emissor, que são as taxas de anuidade cobradas do consumidor e as taxas de juros cobrados na venda parcelada com juros ou no parcelamento rotativo.
O juro do rotativo é aquele altíssimo. Vai cair?
Pellizzaro - O custo do pagamento parcelado (crédito rotativo) dos cartões ainda nem sinalizou em cair. Vai até 12% ao mês, ou seja, acima de 550% ao ano. Para nós, como comerciantes, isso nos preocupa muito. Quando o consumidor gasta muito pagando juros não sobra dinheiro para gastar em compras. Tanto que o nosso projeto interno, na confederação, se chama Eu quero o meu consumidor de volta. Não quero que ele pague juro, quero que ele gaste comigo. Todo o nosso trabalho, hoje, na área de regulamentação do cartão, junto com o Congresso Nacional, Governo, através do Banco Central, do Ministério da Justiça, em relação ao consumidor visa a reduzir isso, e tabelar efetivamente esses custos, unificar, padronizar as formas de cobrança aos consumidores.
Para evitar o pagamento mínimo da fatura?
Pellizzaro - Para se ter uma ideia, se você pegar uma fatura de cartão de crédito vai ver o total da fatura e, com destaque, o valor mínimo a pagar, que é bem pequeninho, induzindo a pessoa a pagar o mínimo, ao invés do valor total. Quando é uma pessoa esclarecida, que sabe os custos das taxas de juros dos cartões, tudo bem, ela vai saber que o melhor é pagar tudo na data do vencimento. Mas quando você pega pessoas das classes C e D e E, que não têm conhecimento de finanças, essa indução leva a cair na areia movediça do crédito rotativo, que tira renda das pessoas. Por isso, o nosso trabalho é solicitar que o governo tabele esse processo e padronize a forma de apresentação, seja por nomenclatura ou layout.
Como resolver as perdas quando o sistema do cartão tem falha?
Pellizzaro - Também estamos cobrando mais responsabilidades de toda a cadeia de cartões. Por exemplo, dia 24 de dezembro do ano passado, a Redecard teve problema técnico e deixou milhares de lojistas sem poder vender. Quem é que paga essas perdas? Hoje, não imputamos responsabilidade a alguém. Nós precisamos ter isso muito mais firme como o sistema bancário. É preciso de uma lei que defina que credenciadoras e bandeiras são agentes financeiros, aí o Banco Central poderá intervir nelas.
Pesquisa da Associação Paulista de Supermercados apurou que as compras com cartões de crédito nas lojas do setor passaram de 20% do total para 40%, entre 2005 e 2010. Esse aumento no país ocorreu com o avanço das classes C, D e E. Há 153 milhões de cartões no país, segundo a Associação Brasileira das Empresas de Cartões e Serviços. Desses, 60% são de pessoas das classes C, com renda mensal entre R$ 1,1 mil e R$ 4 mil.
A média diária de emissão de novos cartões de crédito é de 48,5 mil, segundo dados da Abecs. No primeiro semestre do ano, foram emitidos no país 8,7 milhões de cartões. No período, os números foram 44% maiores do que nos mesmos meses do ano passado.
Na visão da CNDL, o lojista pode vender à vista com dinheiro e com cartão com preços diferentes. Existe uma decisão do STJ que transitou em julgado, promovida pelo Sindilojas do Distrito Federal, que reconhece que isso é possível porque não existe nenhum preceito legal que diz que a venda com cartão é à vista, porque o lojista recebe 30 dias após.
A própria indústria de cartões de crédito, integrada por bandeiras, credenciadoras e bancos, começa a discutir, internamente, para equilibrar ganhos e perdas diante do novo cenário. Isto porque o emissor estava ganhando demais com os juros, o credenciador estava ganhando demais com a taxa de desconto e a antecipação, e a bandeira ganhando dos dois de forma excessiva.
Roque Pellizzaro Junior
Presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas desde 2007, o empresário e advogado Roque Pellizzaro Junior tem como maior desafio do seu mandato na entidade a redução dos custos altíssimos das operações de cartões de crédito no país, para consumidores e lojistas. Natural de Curitibanos, Meio-Oeste de Santa Catarina, foi presidente da CDL da sua cidade por três mandatos e exerceu, por duas vezes, a presidência da Federação das CDLs de Santa Catarina antes de chegar à entidade máxima dos lojistas no país.
Qual é a vantagem de uma única máquina para cartões nas lojas?
Roque Pellizzaro Junior - Tínhamos um contrato entre a Visa e a antiga Visanet, hoje Cielo, que obrigava que os cartões Visa só poderiam ser recebidos pela credenciadora Visanet. E a Visanet não poderia receber nenhum outro cartão que não fosse o Visa. Isso fazia com que existissem dois monopólios no Brasil, o Visanet Visa e o Redecard Mastercard. Lembrando que Visa e Mastercard são bandeiras que representam 97% do mercado de cartões de crédito no país. Com isso, o foco todo da indústria de cartões era nos emissores, os bancos. Quanto mais cartões de uma bandeira eram emtidos, mais clientes tinha, e isso fazia com que os comerciantes pagassem mais de taxa para as credenciadoras Visanet e Redecard. Com a mudança, as máquinas da Cielo (ex-Visanet) e da Redecard podem receber todos os cartões e a gente cria uma concorrência entre as duas. O foco deixa de ser o emissor bancos, e passa a ser o lojista.
As credenciadoras vão ganhar menos com essa mudança?
Pellizzaro - Elas devem perder, de mercado, em torno de 45% nos próximos 12 meses. Nenhum lojista vai ficar com duas máquinas. Ninguém vai gastar duas vezes para ter a mesma coisa. Com isso, elas vão perder mercado e faturamento no aluguel de equipamento. Só na Redecard, o aluguel representava 23% do faturamento. Para as duas, a receita somava R$ 1,5 bilhão de aluguel de maquininhas. Este valor vai baixar para cerca de R$ 1 bilhão a menos em locação, fora uma perda na taxa de desconto de 20% a 30%. Uma empresa que pagava 5% vai pagar 4,2% ou 4% de taxa de desconto. Isso vai adequar melhor o mercado.
A CNDL está incentivando o aumento da concorrência?
Pellizzaro - Já temos a Getnet junto com o Santander, e a First Data, que é a maior credenciadora do mundo, sinaliza que vem para o Brasil. Está procurando parceiros, entre os quais nós, as CDLs. A bandeira Elo está sendo ressuscitada pelo Bradesco e Banco do Brasil.
O que o consumidor paga?
Pellizzaro - O consumidor paga tudo nos cartões. Paga o valor que está embutido na mercadoria, que é a taxa de desconto, e a taxa de antecipação. Quem recolhe a taxa é o lojista, mas quem paga é o consumidor. Além disso, existem os custos vinculados ao emissor, que são as taxas de anuidade cobradas do consumidor e as taxas de juros cobrados na venda parcelada com juros ou no parcelamento rotativo.
O juro do rotativo é aquele altíssimo. Vai cair?
Pellizzaro - O custo do pagamento parcelado (crédito rotativo) dos cartões ainda nem sinalizou em cair. Vai até 12% ao mês, ou seja, acima de 550% ao ano. Para nós, como comerciantes, isso nos preocupa muito. Quando o consumidor gasta muito pagando juros não sobra dinheiro para gastar em compras. Tanto que o nosso projeto interno, na confederação, se chama Eu quero o meu consumidor de volta. Não quero que ele pague juro, quero que ele gaste comigo. Todo o nosso trabalho, hoje, na área de regulamentação do cartão, junto com o Congresso Nacional, Governo, através do Banco Central, do Ministério da Justiça, em relação ao consumidor visa a reduzir isso, e tabelar efetivamente esses custos, unificar, padronizar as formas de cobrança aos consumidores.
Para evitar o pagamento mínimo da fatura?
Pellizzaro - Para se ter uma ideia, se você pegar uma fatura de cartão de crédito vai ver o total da fatura e, com destaque, o valor mínimo a pagar, que é bem pequeninho, induzindo a pessoa a pagar o mínimo, ao invés do valor total. Quando é uma pessoa esclarecida, que sabe os custos das taxas de juros dos cartões, tudo bem, ela vai saber que o melhor é pagar tudo na data do vencimento. Mas quando você pega pessoas das classes C e D e E, que não têm conhecimento de finanças, essa indução leva a cair na areia movediça do crédito rotativo, que tira renda das pessoas. Por isso, o nosso trabalho é solicitar que o governo tabele esse processo e padronize a forma de apresentação, seja por nomenclatura ou layout.
Como resolver as perdas quando o sistema do cartão tem falha?
Pellizzaro - Também estamos cobrando mais responsabilidades de toda a cadeia de cartões. Por exemplo, dia 24 de dezembro do ano passado, a Redecard teve problema técnico e deixou milhares de lojistas sem poder vender. Quem é que paga essas perdas? Hoje, não imputamos responsabilidade a alguém. Nós precisamos ter isso muito mais firme como o sistema bancário. É preciso de uma lei que defina que credenciadoras e bandeiras são agentes financeiros, aí o Banco Central poderá intervir nelas.
Pesquisa da Associação Paulista de Supermercados apurou que as compras com cartões de crédito nas lojas do setor passaram de 20% do total para 40%, entre 2005 e 2010. Esse aumento no país ocorreu com o avanço das classes C, D e E. Há 153 milhões de cartões no país, segundo a Associação Brasileira das Empresas de Cartões e Serviços. Desses, 60% são de pessoas das classes C, com renda mensal entre R$ 1,1 mil e R$ 4 mil.
A média diária de emissão de novos cartões de crédito é de 48,5 mil, segundo dados da Abecs. No primeiro semestre do ano, foram emitidos no país 8,7 milhões de cartões. No período, os números foram 44% maiores do que nos mesmos meses do ano passado.
Na visão da CNDL, o lojista pode vender à vista com dinheiro e com cartão com preços diferentes. Existe uma decisão do STJ que transitou em julgado, promovida pelo Sindilojas do Distrito Federal, que reconhece que isso é possível porque não existe nenhum preceito legal que diz que a venda com cartão é à vista, porque o lojista recebe 30 dias após.
A própria indústria de cartões de crédito, integrada por bandeiras, credenciadoras e bancos, começa a discutir, internamente, para equilibrar ganhos e perdas diante do novo cenário. Isto porque o emissor estava ganhando demais com os juros, o credenciador estava ganhando demais com a taxa de desconto e a antecipação, e a bandeira ganhando dos dois de forma excessiva.
Roque Pellizzaro Junior
Presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas desde 2007, o empresário e advogado Roque Pellizzaro Junior tem como maior desafio do seu mandato na entidade a redução dos custos altíssimos das operações de cartões de crédito no país, para consumidores e lojistas. Natural de Curitibanos, Meio-Oeste de Santa Catarina, foi presidente da CDL da sua cidade por três mandatos e exerceu, por duas vezes, a presidência da Federação das CDLs de Santa Catarina antes de chegar à entidade máxima dos lojistas no país.
Fonte: Diário Catarinense
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