Para tornar clientes fiéis, empresas apostam em vender o produto mais adequado a ele em vez do mais caro
A concorrência está fazendo com que as empresas percebam que a velha tática de sempre "empurrar" o produto mais caro para o cliente pode não ser o melhor negócio. Na briga para fidelizar um consumidor que exige cada vez mais qualidade e transparência, marcas de varejo, serviços e até bancos estão investindo no conceito de consultoria de vendas. Em vez da "empurroterapia" tradicional, a ideia é ajudar o comprador a levar o que é mais adequado às suas necessidades - assim, ele fica mais satisfeito, reclama menos e ganha confiança para uma próxima compra.
A Whirlpool Latin America, das marcas Brastemp e Consul, já adota a estratégia. A empresa não revela quantos consultores mantém nas lojas revendedoras, mas afirma que aumentou em dez vezes o tempo de treinamento desses agentes. Segundo o diretor de serviços da Whirlpool, Fábio Armaganijan, o número de consultores também vai crescer: - Uma reclamação comum no verão é de que o ar-condicionado não gela, por exemplo. Quando o técnico chega à casa do cliente, percebe que o aparelho funciona perfeitamente bem, mas o modelo é inadequado ao tamanho do ambiente.
Com os promotores, a meta é vender, mas vender o produto que o consumidor realmente precisa.
Acesso à internet obriga empresas a lutarem mais pelo cliente Para a professora da ESPM Lívia Barbosa, estudiosa da Antropologia do Consumo, o crescente acesso à informação torna a tendência inevitável: - As lojas que não perceberem essa mudança no comportamento do consumidor dificilmente sobreviverão.
O cliente está mais consciente do que compra e sempre busca referências com amigos e na internet.
A operadora de celular Claro lançou em maio um plano pós-pago em que o cliente monta seu próprio pacote. Para auxiliar os usuários na hora da contratação, a operadora treinou por cerca de seis meses todos os vendedores de seus mais de três mil pontos de venda. Segundo a diretora regional para Rio e Espírito Santo da Claro, Gabriela Derenne, o objetivo é ajudar o cliente a identificar seu próprio perfil: - No ramo de serviços, não adianta "empurrar" o que é mais caro.
Quando isso é feito, o cliente ou fica insatisfeito e desiste do negócio ou não consegue pagar a conta e causa prejuízo à empresa.
No setor bancário, o Itaú Unibanco e o Santander também já aderiram à tendência. O superintendente de empréstimo para pessoa física do grupo espanhol, Rogério Estevão, acredita que o banco deve ser visto como parceiro. Ele ressalta que, em pleno movimento de bancarização no Brasil, é importante "acabar com a barreira cultural e psicológica que faz com que as pessoas se envergonhem de ir ao banco pedir ajuda": - O banco não deve ter medo de dizer que um produto é mais barato do que outro. E, como a maior parte das transações bancárias hoje estão fora das agências, é preciso que as informações sobre os produtos estejam disponíveis em todos os meios, para que o consumidor possa optar por um crédito que seja mais adequado as suas necessidades. Hoje, parte da remuneração dos nossos funcionários está vinculado à satisfação do cliente.
Já o Itaú Unibanco, quando houve a fusão, unificou sua equipe de 550 consultores de investimento, que antes eram setorizados. Segundo o diretorexecutivo de operações de investimento, Osvaldo do Nascimento, isso acabou com o possível enviesamento dos conselhos - o consultor da área de previdência tendia a favorecer seu próprio setor, por exemplo. Hoje, a equipe avalia inclusive investimentos que o cliente tenha fora do banco.
- Isso cresceu com a estratégia de ajustar o foco do banco do produto para o cliente. Dar a melhor opção para ele, mesmo que o produto não seja nosso, favorece o bom relacionamento - afirma Nascimento.
Para o consultor de varejo Marco Quintarelli, a prática de ajudar o cliente tem dado certo no mercado.
Ele lembra que a tendência teve origem nas lojas de produtos femininos, cujo público é o mais exigente e mais bem informado sobre o que compra. É o caso da loja de perucas e apliques de cabelo Fiszpan, que mantém equipe de consultores em toda a sua rede.
- Hoje em dia, o consumidor não compra mais produto. Ele compra uma solução - afirma Quintarelli.
Mas Polyanna Silva, advogada da Pro Teste, teme que essa nova filosofia de venda esconda mais uma tática de "empurrar" produtos: - Se ajudar o cliente a obter mais informação, isso é ótimo e favorece a transparência. Mas é preciso cuidado quando uma marca resolve "ajudar" na compra dos seus próprios produtos. Mas, não importa quais sejam as informações dadas pelos consultores das marcas, a loja é sempre responsável por elas.
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